Fábricas de Lanifícios
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Fábricas de Lanifícios
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Fábricas de Lanifícios

Os tecidos constituem, ao longo da História, uma preocupação fulcral para o Homem, como necessidade básica de proteção, como moeda de troca e como símbolo de poder e riqueza. A sua produção, feita a partir de recursos naturais, assume importância desde a Pré-História, mas é com as primeiras civilizações que ganha mais ênfase. É, assim, na Mesopotâmia que a lã se revela essencial, explorada através da domesticação de carneiros e ovelhas.

Em Portugal, as primeiras referências sobre lanifícios remetem-nos para o século XVII. Esta indústria, que tem especial relevância na região da Beira Interior, vai acompanhar o desenrolar de acontecimentos sociais e políticos que atravessam o nosso país e o mundo, sendo que encontramos atualmente nesse território um conjunto de edifícios cujas paredes contam histórias de um período de grande desenvolvimento e que nos levam a pensar no percurso traçado até então.

Ao longo da História, começou a concentrar-se nesta área a produção de lanifícios nacionais, devido à proximidade aos recursos naturais. Inicialmente, as estruturas socio-económicas eram de base agro-pastoril, mas ao longo dos tempos evoluíram para a manufatura capitalista. Todavia, a sua implementação e afirmação só foi possível graças à fixação, nesta região, de um conjunto de Judeus convertidos ao cristianismo. Os Cristãos-Novos, como eram designados, procuraram estas regiões recônditas para garantir a sua segurança, por lhes permitir um isolamento face às constantes perseguições encabeçadas pela Inquisição.

Durante a Época Moderna, assistimos a uma dependência de Portugal no que diz respeito aos tecidos, cuja aquisição era feita ao estrangeiro, por ausência de produção nacional em grande escala. Neste contexto, foi necessária a intervenção do Estado para fazer face a esta dependência. Destaca-se, assim, a ação de D. Luís de Meneses, 3.º Conde da Ericeira, ao colocar em marcha medidas que procuravam equilibrar a balança comercial portuguesa, substituindo as importações por bens de fabrico nacional e acabando, assim, com a dependência dos tecidos espanhóis e ingleses.

Protegeu também esta produção nacional através das leis “pragmáticas”, que proibiam o uso de certos produtos de luxo importados, nas quais se inserem os tecidos. Exemplo disso é a criação da Fábrica de Sarjas e Baetas, primeira manufatura de Estado, na ribeira da Carpinteira, que acabou por ser reproduzida em outras vilas da Beira Interior.

Todavia, no início do século XVIII, o Tratado de Methuen abriu o mercado luso-brasileiro aos têxteis britânicos, o que trouxe duras consequências no ritmo de produção nacional. Portugal alimentava, assim, a fragilidade do seu setor produtivo, sendo importador crónico de bens manufaturados. Era necessário contrariar esta tendência, realidade que veio materializar-se com Marquês de Pombal.

Adepto das doutrinas mercantilistas, promoveu o desenvolvimento industrial, fundou, remodelou e apoiou as manufaturas têxteis, essencialmente na região das beiras e da Serra da Estrela. Criou a Real Fábrica de Panos, dependente diretamente da Junta do Comércio, que concentravam num mesmo espaço os vários processos de produção, anunciando o aparecimento das primeiras fábricas de organização vertical.

Com o advento das Revoluções Liberais na América e na Europa, a produção de lanifícios nestas vilas da região da Beira vai virar-se para a produção interna.

Chegados ao século XIX, a maior parte dos países europeus havia iniciado e desenvolvido o seu processo de industrialização, mas Portugal mantinha-se um país predominantemente rural, onde a indústria era pouco representativa e só a pauta alfandegária de 1837 e outra legislação protecionista ajudaram a proteger a escassa indústria nacional e a motivar os industriais a investir.

Ao longo deste século, fizeram-se algumas tentativas para investir na modernização industrial dos lanifícios, nomeadamente através da instrução profissional e da instalação da primeira máquina a vapor em Castelo Branco e mais tarde na Covilhã. Estas alterações culminaram, em finais do século, no período conhecido como Regeneração, numa significativa evolução industrial na região, atraindo um elevado número de população para aí se fixar.

Após este período de acentuado crescimento no processo de industrialização de lanifícios, a Beira Interior mergulha num período conturbado, mercê de um conjunto de perturbações suscitadas, essencialmente, pela instauração da República, e pela intensa luta operária que coloca em causa as condições de trabalho e os salários.

Este período de declino será travado com a I Guerra Mundial, onde a indústria encontra uma oportunidade de produzir vários derivados de lã em larga escala, devido ao facto dos países beligerantes terem descontinuado a sua produção.

Durante o período do Estado Novo, a indústria têxtil beneficiará de um conjunto de medidas protecionistas, mas também será sujeita a um conjunto de regras para a criação de novas unidades industriais, que eram seguidas de forma rigorosa por este Estado intervencionista.

A situação da indústria de lanifícios a nível regional viria a beneficiar da conjuntura internacional decorrente da Guerra Civil Espanhola e da II Guerra Mundial, devido à diminuição da concorrência externa e pelo aumento da procura de fardamentos militares, que representavam uma nova oportunidade de expansão, com especial destaque para a Covilhã. Com a adesão de Portugal à EFTA afirma-se, por um lado, uma maior facilidade de acesso a novos mercados mas, por outro lado, uma concorrência com que Portugal não conseguia competir, devido à falta de modernização das estruturas industriais e comerciais.

Com o fim do regime salazarista, a crise energética, a perda de mercados coloniais e a subida de salários, estas indústrias começaram a entrar em decadência, sendo assim devotadas ao abandono.

Ao longo do trajeto dos Passadiços do Mondego poderá observar algumas das antigas fábricas de lanifícios que operavam junto ao Mondego.